JBS: a “Reserva da boa vontade” e a Teoria da Dádiva!

24 de maio de 2017
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“Pixuleco”, “Bola”, “BV – de ‘bem vindo’” entre outras tantas expressões são usualmente utilizadas na gíria brasileira para definir o suborno. Recentemente, na delação premiada do executivo da JBS, Ricardo Saud, ouvimos uma nova expressão: “Reserva da Boa Vontade”. Além de admitir que a criatividade brasileira é de fato ímpar, temos que buscar compreender a dimensão social dessa inovadora expressão.

Para viabilizar o estudo deste contexto social, é preciso considerar que atores econômicos reais se pautam não somente pela busca de seus próprios interesses, mas também pelo “oportunismo” que é a busca ardilosa do interesse próprio e pela pressuposição de maximização do lucro. Forçosamente, assumindo a ausência de oportunismo, assumiríamos que não haveria qualquer litigância de má-fé nas transações intrínsecas às organizações, o que seria o “mundo da utopia”.

JBS: um pouco de oportunismo, outro pouco de dádiva!

O oportunismo pode estar transvestido como algo positivo, ou até mesmo inocente, tanto que nas delações ouvimos por diversas vezes, a expressão “amigo” ou ainda “estamos junto!” no lugar de “corrupto” ou “fazemos parte desse esquema de corrupção”.

Uma das formas usualmente aplicada na corrupção é a DÁDIVA, conceito teorizado pelo antropólogo Marcel Mauss (1925)* o qual entende a dádiva como um sistema geral de obrigações coletivas, imbuído de um elemento de incerteza estrutural na regra tripartida do dar-receber-retribuir:

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Escapando da hiper-presença de uma obrigação coletiva, que deveria se impor tiranicamente sobre a liberdade individual. Para Mauss, a dádiva é algo inalienável, uma vez que representa o próprio doador, logo, se este não for devolvido, será humilhado e indigno, gerando assim uma dependência social.

A dádiva se manifesta em diversos lugares e, a escolha e delimitação das formas de intercâmbio social são preeminentes diante dos limites desse estudo. Dar, receber e retribuir é fazer circular presentes, favores, serviços, gentilezas, palavras, discursos, objetos, entre outros. A informação é um desses bens, intangível nas organizações, mas que podem gerar danos patrimoniais e de imagem quando ela é exposta de maneira inadequada, daí o escopo do estudo – a informação privilegiada e confidencial da organização como bem simbólico da dádiva nas organizações.

Conheça o Infográfico do Pentágono da Fraude, que aponta os motivos pelas quais a fraude não compensa! 

Considerando que o principal objetivo da dádiva é: criar, consolidar e reproduzir os laços sociais entre os parceiros da troca de dádivas, privilegia interesses instrumentais e utilitários como, por exemplo, o interesse da aliança. Como estamos acompanhando nas mídias e nos jornais, é um ato político por excelência.

Trazendo para a realidade dentro das organizações, a reflexão que fica é: será que nossos colaboradores não estão fazendo suas “reservas de boa vontade” em detrimento aos interesses da própria organização?

*MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva. Tradução de António Filipe Marques. Lisboa: Edições 70, 2003.